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sexta-feira, 13 de abril de 2018

Chaves & Chapolin Colorado

          
           Em meio a uma programação dominada por seriados vindos sempre do mesmo país, os Estados Unidos, a televisão brasileira tem a rara, mas brilhante, opção de programas de origem mexicana que alegram os brasileiros há décadas. São as criações de Roberto Gómez Bolaños (1929-2014), entre as quais eu vou destacar “Chaves” e “Chapolin Colorado”, exibidos pelo SBT. Bolaños exerceu várias atividades: ator, diretor, humorista, compositor, cantor, produtor de televisão, publicitário, roteirista, além de ser formado em Engenharia Elétrica, sem ter seguido a carreira. Ele é conhecido em seu país natal como ‘Chespirito’, derivação em espanhol de Shakespeare, comparação que recebeu pela sua capacidade e talento de redigir textos.
 
            Os programas de Bolaños foram exibidos em diversos países pelo mundo, fazendo enorme sucesso na América Latina e, principalmente, no Brasil. Em Los Angeles, EUA, Chaves chegou a ganhar um dia comemorativo em sua homenagem, celebrado todo dia 8 de setembro. Vários produtos surgiram em função dos seriados: discos musicais, desenho animado, quadrinhos, licenciamento para uso da imagem dos personagens em brinquedos, roupas, alimentos, material escolar etc.  
O curioso é que o SBT comprou os seus direitos de exibição, na década de 1980, como contrapeso a um pacote de novelas mexicanas, e os programas não agradaram a seu proprietário, o apresentador e empresário Silvio Santos, nem aos demais diretores, mas todos acabaram descobrindo que eram justamente esses os principais produtos a serem exibidos. Em 1990, a emissora comprou novo pacote de episódios. Os programas contavam com uma produção modesta, as roupas dos personagens muitas vezes eram dos próprios atores, como as do seu Madruga. A primeira exibição no SBT foi em 1984, apenas três anos após a inauguração da emissora paulista.




 “Chaves” (“El Chavo del Ocho”, por conta do canal mexicano que o exibia inicialmente era o Canal 8, da Televisión Independiente de México, e a casa onde ele supostamente morava era a casa 8, apesar de nunca ter sido visto nela) é o programa principal e o mais querido. É a estória de um menino órfão, de 8 anos, que vive com fome e sempre vestido com a mesma roupa, rasgada, interpretado por Bolaños. O seu nome verdadeiro nunca foi revelado; “chaves” é uma gíria em espanhol, que significa garoto, menino. Eu lembro que em um episódio, Chaves ia dizer o seu nome, mas foi interrompido, acho que pelo Quico.
Desde sua estreia, os episódios de “Chaves” vêm sendo repetidos pelo SBT, sempre com muito sucesso, e quando a emissora o tira do ar recebe uma enxurrada de reclamações dos chamados ‘chavemaníacos’. O seriado conquistou admiradores em várias faixas de idade, sejam crianças ou adultos, e vem mantendo o interesse, apesar de já passado tanto tempo de sua exibição original e das repetições já terem ocupado vários horários da programação, de manhã, de tarde e à noite. O seu público não cansa, e, apesar das piadas serem hoje consideradas bobas, ingênuas e, mesmo, conhecidas, ainda agradam, tanto que o SBT não deixa de exibir o programa. A emissora, aliás, tem se beneficiado muito dessas séries, responsáveis pela sua popularização na década de 1980.
E justamente por causa de tanto sucesso, o Multishow, das organizações Globo, anunciou em janeiro a compra dos direitos de exibição para TV por assinatura e internet dos seriados “Chaves” e “Chapolin Colorado”. A emissora pretende, inclusive, exibir episódios ainda inéditos no Brasil, os chamados “episódios perdidos”, que não foram exibidos devido à sua baixa qualidade técnica, produzindo a sua própria dublagem. Mas, segundo a imprensa divulgou, o SBT ainda detém os direitos para a TV aberta até o fim de 2020. Eu lembro que há um tempo atrás o canal de TV a cabo Boomerang chegou a exibir os dois programas, em diferentes horários, inclusive a partir da meia-noite.  



 As estórias se passam, em sua maioria, em uma vila pobre, propriedade do sr. Barriga (Edgar Vivar). Chaves (Roberto Bolaños) supostamente morava na casa de nº 8, mas ela nunca foi mostrada, nem esclarecido com quem ele moraria, pelo menos que eu saiba, e sempre que ele se aborrecia ou apanhava do seu Madruga, ele entrava em um barril, que ficava no pátio da vila. Seus amiguinhos eram o Nhonho, filho do sr. Barriga, que não morava na vila, e também era interpretado por Edgar Vivar; Quico (Carlos Villagrán), menino também órfão de pai, de grandes bochechas, mimado pela mãe e que costumava se gabar dos seus brinquedos mais caros; e a Chiquinha (Maria Antonieta de las Nieves), a mais madura e esperta das crianças, e que tinha uma paixão não correspondida por Chaves.
Os moradores adultos eram igualmente problemáticos. O sr. Madruga (Ramón Valdés), viúvo, pai da Chiquinha, vivia desempregado, procurava de todas as maneiras fugir do trabalho, apesar de às vezes acabar fazendo algum serviço para conseguir pagar os 14 meses de alugueis atrasados ao sr. Barriga, seja como sapateiro, leiteiro, carpinteiro, vendedor dos churros da dona Florinda etc. Dona Florinda (Florinda Meza), uma senhora que vivia com bobes no cabelo e sempre se lamentava por ter que morar com vizinhos tão desqualificados. Um dos momentos mais engraçados era justamente quando, depois de bater no seu Madruga, ela chamava o filho para dentro de casa, e dizia para ele: “Venha, Quico, não se junte com essa gentalha!”. Ela era apaixonada pelo professor Jirafales (Rubém Aguirre), professor das crianças, em uma relação com muita insinuação e pouca atitude, e que vivia sendo chamado de “professor Linguiça”, por conta de sua altura.
Outra vizinha da vila era a Dona Clotilde (a espanhola Angelines Fernández), mais conhecida como a Bruxa do 71, uma senhora solteira e que tentava de todo o jeito se casar com o sr. Madruga, e era temida pelas crianças, que a viam como uma bruxa. Aliás, um dos episódios mais legais que eu lembro ter assistido foi o “A Casa da Bruxa do 71”, em que os meninos acreditam ter entrado no seu “castelo”, na realidade, era a sua casa. O nome da personagem faz menção a um costume da década de 1970, no México, onde as misses eram conhecidas como “Musa de 1968”, “Musa de 1969” etc., e Roberto Bolaños fez a adaptação para o inverso, como brincadeira, usando o ano de 1971. Jaiminho (Raúl ‘Chato’ Padilla) era o carteiro que fazia tudo bem devagar, para “evitar a fadiga”, vivia falando de sua cidade natal, Tangamandápio, pequeno município do estado de Michoacán, no México, e que acabou homenageando o personagem com uma estátua em 2012.
Dona Neves, interpretada pela própria Maria Antonieta de las Nieves, era a avó da Chiquinha. Pópis, sobrinha da dona Florina, era uma menina fanha, vivida também pela atriz Florinda Meza; lembro do Roberto Bolaños dizer em uma entrevista no programa do Ratinho, no SBT, que um dia ele recebeu uma carta de um pai dizendo que toda vez que a Pópis aparecia na televisão, seu filho sofria com deboches dos coleguinhas por ser gago, e ele diz ter sofrido muito com isso. Outros personagens, considerado secundários, completam o elenco. Carlos Villagrán, Edgar Vivar e Maria Antonieta de las Nieves já vieram várias vezes ao Brasil, participando de programas de televisão e fazendo shows, sempre com muito sucesso. Rubém Aguirre, pelo que pude pesquisar, veio uma vez, em 1996; Florinda Meza, em 2015, e Roberto Bolaños, em 1981, quando estava a caminho do Paraguai, em turnê com o elenco de “Chaves”, tendo ficado dois dias em Foz do Iguaçu.  
Os programas de “Chaves” e “Chapolin Colorado” foram antecedidos por outros, com os mesmos atores vivendo curtas situações de humor, tais como “Chespirito” e "Los Supergenios de la Mesa Cuadrada". Foi entre esses quadros que surgiram os personagens do Chaves e do Chapolin Colorado, que viriam a ter seus próprios programas depois. Os dois programas começaram a ser exibidos no México em 1970-1971, pelo Canal 8, da Televisión Independiente de México. Em 1975, Roberto Bolaños os levou para o Canal 2, da Telesistema Mexicano, mas no mesmo ano os dois canais se uniram, dando origem à Televisa. Durante o período em que foram gravados, alguns atores deixaram os seriados.
Em 1973, Maria Antonieta de las Nieves foi para o Canal 13, e a maneira encontrada por Bolaños foi dizer que a Chiquinha tinha ido estudar no interior (a tradução optou pela cidade paulista de Presidente Prudente), e morar com uma tia. No ano seguinte ela retornou. Mas em 2002, Bolaños a processou por uso da imagem da personagem sem autorização; anos depois a atriz venceu a disputa, sendo autorizada a interpretar a Chiquinha, mas a amizade nunca mais foi restabelecida. A adaptação de “Chaves” para desenho animado, em 2006, excluiu o personagem da Chiquinha.
Em 1978, Carlos Villagrán também saiu, interpretando o personagem Quico em shows, o que acabou gerando uma desavença com Roberto Bolaños, inclusive uma disputa judicial pelos direitos do personagem. Para contornar a ausência de Quico na série, dona Florinda abriu um restaurante, onde passava a maior parte do tempo. Bolaños morreu em 2014, sem falar com Villagrán há anos. Em 1979, foi a vez de Ramón Valdés deixar os programas, passando a trabalhar com Villagrán em programas de TV na Venezuela, em que o nome do personagem Quico foi alterado para “Kiko”. Carlos Villagrán diz que o sucesso do seu personagem o tornava mais querido e com mais destaque no programa “Chaves”, o que teria causado ciúmes a Bolaños. Além disso, dizem que o fato dele ter namorado com a atriz Florinda Meza, antes de ela casar com Roberto Bolaños, em 2004, teria contribuído para o afastamento dos dois.
Entre os atores principais, somente Florinda Meza, Carlos Villagrán e Maria Antonieta de las Nieves estão vivos. Roberto Bolaños faleceu em 2014, aos 85 anos de idade. “Chaves” é um programa repleto de situações “politicamente incorretas” para os dias atuais. O Seu Madruga bate nas crianças; a Dona Florinda esbofeteia o Seu Madruga; todos fazem bullying uns com os outros o tempo todo; e por aí vai... Mas também procura inserir críticas sociais no contexto dos episódios, como a situação das crianças pobres e os desníveis sociais da sociedade mexicana, bem semelhantes aos existentes nos países latino-americanos em geral. Em várias oportunidades eu já ouvi o ator Edgar Vivar dizer que todos os textos e diálogos de Chaves e Chapolin Colorado eram criação do próprio Roberto Bolaños.
“Chapolin Colorado” (“El Chapulín Colorado”) surgiu em 1970, e é uma paródia de Bolanõs aos super-heróis famosos dos Estados Unidos, com muitas tiradas sobre a situação política da época. Ele é um anti-herói, como o próprio criador o define: “Chapolín não tem as propriedades extraordinárias dos super-heróis: é tonto, desastrado e medroso. Mas também é um herói porque supera o medo e enfrenta os problemas e é aí que estão o heroísmo e a humanidade.”  
Os atores participantes são os mesmos do programa “Chaves”, com a diferença que Bolaños é o único com um personagem fixo, o próprio Chapolin, enquanto os demais podiam fazer vários outros diferentes, apesar de alguns vilões aparecerem mais vezes, como o Tripa Seca e o Quase-Nada. Ramón Valdez interpreta o Super Sam, uma mistura do ‘Super Man’ com o Tio Sam; uma caricatura de um herói com forte sotaque inglês e sempre segurando um saco de dinheiro.
A palavra “chapulín” significa grilo, gafanhoto. O herói aparecia de repente, sempre que alguém, em desespero, perguntava: “Oh! E agora... quem poderá me defender?”, e suas aventuras podiam se passar em qualquer época da História, na Idade Média, no Velho Oeste, ou mesmo no espaço. O programa terminou em 1979, praticamente ao mesmo tempor que “Chaves”, mas ambos retornaram na década seguinte como quadros no programa “Chespirito”, batizado no Brasil como “Clube do Chaves”, parando de vez em 1992. Em 2015, a série também foi adaptada para o desenho animado na TV.
Chapolin Colorado tem sido homenageado pelo mundo dos quadrinhos. Em “Os Simpsons”, por exemplo, tem o personagem Bumblebee Man, criado após Matt Groening, o criador da família amarela, ter assistido o programa mexicano em um motel na fronteira dos EUA com o México. A Marvel também criou um personagem inspirado no Chapolin. Ano passado, o mexicano Humberto Ramos e o estadunidense Mark Wais criaram a heroína Red Locust (“Gafanhoto Vermelho”). [Informações pesquisadas na internet.] fr
 
 
 
 

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