África
exige da Europa restituição de tesouros roubados
Do British Museum de Londres ao Museu Tervuren da Bélgica, numerosas coleções
europeias transbordam de objetos de arte chamados 'coloniais', adquiridos em
condições muitas vezes discutíveis.
Por France Presse - 01/06/2018
Embora de acordo com a etiqueta os
três totens expostos no Museu Quai Branly de Paris sejam uma
"doação", seu país de origem, o Benim pede a restituição do que
considera um tesouro roubado durante a época colonial.
Na realidade, essas imponentes
estátuas foram pegas em 1892 pelas tropas francesas do general Alfred Amédée
Dodds durante o roubo do Palácio de Abomey, a capital histórica do atual Benim.
Segundo o Benim, na França existem
entre 4.500 e 6.000 objetos que pertencem ao país, incluindo tronos, portas de
madeira gravada e cetros reais.
Do British Museum de Londres ao Museu
Tervuren da Bélgica, numerosas coleções europeias transbordam de objetos de
arte chamados "coloniais", adquiridos em condições muitas vezes
discutíveis.
Naquela época, militares,
antropólogos, etnógrafos e missionários que percorriam os países conquistados
voltavam para casa com recordações compradas ou trocadas, e às vezes roubadas.
Inclusive o ex-ministro francês de
Cultura André Malraux foi condenado nos anos 1920 no Camboja por ter tentado
arrancar os baixo-relevos de um templo khmer.
A controvérsia não é nova e não
concerne unicamente à África. Há décadas a Grécia exige ao Reino Unido, em vão,
a restituição dos frisos do Partenon.
Mas o continente africano foi
especialmente afetado.
'Hemorragia'
patrimonial
"A África sofreu uma hemorragia
de seu patrimônio durante a colonização e inclusive depois, com o tráfico
ilegal", lamenta El Hadji Malick Ndiaye, conservador do museu de arte
africana de Dakar.
Mais de 90% das peças importantes da
África subsaariana estão fora do continente, segundo os especialistas. A Unesco
apoia há mais de 40 anos a luta dessas nações para que lhes restituam seus bens
culturais desaparecidos durante a época colonial.
Para Crusoe Osagie, porta-voz do
governador do estado de Edo, na Nigéria, não é normal que seus filhos tenham
que ir ao exterior para admirar o patrimônio de seu país. "Esses objetos
pertencem a nós e nos tiraram à força", destaca.
Assim como o Benim, cujo pedido de
restituição foi negado pela França em 2016, outros países africanos receberam
negativas.
Contudo, houve exceções, como em
2003, quando o museu etnológico de Berlim devolveu uma preciosa estátua de um
pássaro ao Zimbábue, ex-colônia britânica.
Os dirigentes africanos esperam agora
uma mudança de atitude da França, depois que o presidente Emmanuel Macron disse
em novembro em Burkina Faso que dará "as condições para uma devolução do
patrimônio africano à África" em um prazo de cinco anos.
Uma "ruptura histórica",
segundo o ministro camaronês da Cultura, Narcisse Mouelle Kombi. Seu país,
colonizado sucessivamente por Alemanha, França e Grã-Bretanha, "é um dos
principais interessados", afirma.
"Macron se comprometeu com os
africanos a mudar o que tem sido as cinco últimas décadas da política de nossos
museus: encontrar as artimanhas jurídicas necessárias para evitar a
devolução" das peças, observa o historiador Pascal Blanchard, especialista
na época colonial.
O Museu Quai Branly de Paris não quis
responder às perguntas da AFP.
Paternalismo
Mas ainda existem muitos obstáculos
técnicos e jurídicos, admitem os dois especialistas que o presidente Macron
nomeou em março para concretizar sua promessa.
Para se negar a devolver as obras, os
especialistas argumentaram durante anos que os museus africanos não têm as condições
adequadas de segurança e conservação.
Mas de acordo com o conservador do
museu de Dakar, El Hadji Malick Ndiaye, se trata de um velho debate, inclusive
"paternalista". Na África "existem muitas instituições de
museus, na África do Sul, no Quênia, no Mali, em Zimbábue", assegura.
O British Museum propôs empréstimos à
Nigéria e à Etiópia, saqueadas durante uma expedição britânica em 1868, mas
resiste a restituir os bens.
O debate está mais avançado na
Alemanha, um país sensível a isso pelos espólios da época nazista e os roubos
do Exército Vermelho.
Vários museus estão trabalhando para
identificar a origem de milhares de obras da época colonial, quando a Alemanha
controlava Camarões, Togo e Tanzânia. É o caso do Museu Humboldt Forum, que
abrirá em breve em Berlim e especificará a procedência dos objetos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário