
Em agosto do ano passado, fiz uma visita guiada pela Casa Rui Barbosa, no
bairro de Botafogo. Um estagiário da instituição me mostrou todos os cômodos da
residência do advogado, jurista, jornalista, político e diplomata baiano Rui
Barbosa (1849-1923). Eu já tinha feito uma visita ao local em 1999, e revolvi
voltar. Esta é uma das últimas antigas chácaras agrícolas que restaram na
região, transformada em residência no século 19.
Rui Barbosa morou na propriedade com a esposa,
Maria Augusta Viana
Bandeira, e os cinco filhos durante
os anos de 1895 e 1923, quando faleceu. Em 1924, por decisão da viúva, que
preferiu que a propriedade ficasse sob a administração da União, ela foi adquirida
pelo governo brasileiro, junto com a biblioteca e o arquivo pessoal de Rui
Barbosa. Quatro anos depois, foram os móveis. E em 1930, foi inaugurado o
Museu.
A Casa é provavelmente a mais antiga
construção preservada do período da primeira ocupação do bairro. A sua transformação
também em fundação se deu através da lei nº 4.943, de 6/4/1966, assinada pelo
presidente Castello Branco. É uma
instituição pública federal que tem entre suas finalidades o estudo, a
preservação e a divulgação da vida e obra completa de Rui Barbosa, além de
outras temáticas, como a literatura brasileira. Sua origem foi em 1928, com a
criação do Museu-blblioteca pelo então presidente da República Washington Luís.
Além disso, a área da propriedade é aberta para o público passear e curtir a
natureza.

O quiosque está situado em uma pequena ilha,
envolta por um lago. Dentro dele, Rui Barbosa e a família usavam um chuveiro
para se refrescarem do calor. O jardim da propriedade teve sua lateral direita
destruída para o aumento de extensão da Rua Assunção. Em seu governo,
Washington Luis mandou que a área fosse reconstruída, em uma reforma feita em
1930, porém o aspecto da época em que Rui Barbosa morava na casa não foi
refeito.


Rui Barbosa organizou uma extensa e bem
cuidada biblioteca, com mais de 35 mil livros, em sua maioria jurídicos,
cuidadosamente organizados em estantes construídas sob medida. Ele enviava os
seus livros para serem encadernados em Paris, até a Primeira Guerra Mundial,
quando o conflito o obrigou a passar o serviço a um encadernador daqui mesmo da
cidade. Na Casa de Rui Barbosa são organizados cursos, seminários, exposições,
e atividades culturais diversas, como música, teatro, cinema e dança, além de
atividades para o público infantil. Cada aposento da Casa tem um nome
relacionado a uma passagem de sua vida.
O jardim tem mais 9.000 metros quadrados; é
lindo e é um ambiente muito agradável para se estar, além de ser uma das poucas
áreas verdes do bairro de Botafogo. É considerado um jardim de importância
histórica, de acordo com a Carta de Florença, documento que normatiza a
preservação de jardins. Rui Barbosa gostava muito de cuidar do seu jardim,
inclusive plantando ele mesmo algumas das plantas e árvores. O pau-brasil que
está lá foi plantado em 1930, pelo então presidente da República, Washington
Luis, quando o Museu Casa de Rui Barbosa foi inaugurado.








A propriedade como um todo, por conta de sua
importância histórica e artística, está protegida pelo Iphan (Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), desde 1938. Na área externa da
residência, estavam localizados os quartos dos empregados da família; uma
garagem, que era a antiga cocheira, onde estão quatro veículos, sendo três de
tração animal e um automóvel Benz, de tração a motor; e os tanques, para matar
a sede dos cavalos.
O Landô é o carro mais antigo, presente do
seu cunhado, Francisco Dobbert; fabricado na Alemanha, era puxado por quatro animais.
O Cupê é
francês, foi um presente para a esposa de Rui Barbosa, Maria Augusta, dado pelo
irmão dela, Carlos Viana Bandeira. Puxado por dois animais, ele era usado pelo
casal para ir ao teatro. O Vitória é inglês, também puxado por dois animais, e
era usado diariamente por Rui Barbosa para ir ao Centro da cidade.
O
automóvel a motor Benz, fabricado em 1913, placa 833, é o modelo Mercedes-Benz
mais antigo existente no país, segundo a página da própria empresa na internet,
que eu consultei. Ele tem o volante à direita e fazia uma média de 25
quilômetros por hora, podendo chegar a velocidade máxima de 80 quilômetros. O
freio de mão, a alavanca das marchas e a buzina ficam na parte externa, onde
fica também a manivela para dar partida no motor. Na cabine do passageiro tem um fone para
comunicação com o motorista. Uma das portas tem gravado o monograma RB.
A Fundação Casa de Rui Barbosa entende e
orienta a que se escreva o nome do jurista com “i”, e não com “y”, como ele foi
registrado em cartório. Defende que os nomes de pessoas falecidas devem
respeitar as regras da ortografia, assim como os nomes comuns. Mas respeita se
os seus descendentes fizerem questão de utilizar o nome tal qual está no
registro.
Em 73 anos de vida, Rui Barbosa atuou em
várias áreas de grande importância para o país. Posicionou-se em defesa do fim
da escravidão, e contra o alistamento militar obrigatório. Apoiou a proclamação
da República, tendo sido o ministro da Fazenda e o ministro interino da Justiça
no Governo Provisório. Foi ele quem redigiu os primeiros decretos republicanos.
No ano de 1890, apresentou o projeto de separação da Igreja do Estado; elaborou
o texto definitivo do projeto da primeira Constituição da República, que viria
a ser promulgada no ano seguinte; e foi eleito para o primeiro mandato de
senador, pelo estado da Bahia. Em 1892, defendeu no STF (Supremo Tribunal
Federal) habeas corpus em favor dos presos políticos.








Escreveu vários artigos
no Jornal do Brasil contrários à política do presidente Floriano Peixoto, em
1893, quando foi obrigado se exilar em Buenos Aires por ser acusado pelo
governo de participar da chamada Revolta da Armada. No ano seguinte, foi para a
Europa, ficando em Lisboa, depois Madrid, Paris e Londres; retornando ao Brasil
em 1895. Foi contra a campanha pela vacinação obrigatória em 1904; e
candidatou-se a presidente da República em 1905. Representou o Brasil na
Segunda Conferência da Paz, em Haia, na Holanda, em 1907, como embaixador
extraordinário, ministro plenipotenciário e delegado, em que teve participação
de destaque.
No ano seguinte, foi
eleito presidente da ABL (Academia Brasileira de Letras), por conta do
falecimento de Machado de Assis, função que exerceu até 1919. Concorreu
novamente à presidência da República em 1910, na chamada “Campanha Civilista”,
pelo fato de ser um candidato civil concorrendo contra o marechal Hermes da
Fonseca, que acabou eleito. Em julho de 1913 ainda lançou mais uma vez sua
candidatura à presidência da República, mas a retirou em dezembro. Em 1918, não
aceitou o convite do presidente Rodrigues Alves para chefiar a delegação
brasileira na Conferência da Paz, que veio a ser realizada no ano seguinte, em
Paris. O chefe da nossa delegação acabou sendo Epitácio Pessoa, que viria a ser
eleito presidente em 1919, disputando com o próprio Rui Barbosa, em sua quarta
tentativa de ser eleito para o cargo.
Desligou-se da Academia
Brasileira de Letras em maio de 1919. Dois anos depois, escreveu a famosa ‘Oração
aos Moços’, um discurso que fez como paraninfo dos formandos da turma de 1920
da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, em São Paulo. No mesmo ano,
foi eleito para o quinto mandato de senador; e eleito juiz da Corte Permanente
de Justiça Internacional de Haia. Morreu no dia 1º de março de 1923, em sua
casa em Petrópolis. O seu corpo foi velado na Biblioteca Nacional, no Rio de
Janeiro, e enterrado no Cemitério São João Batista. Em 1949, ano do centenário
de seu nascimento, seus restos mortais foram transferidos para o Fórum Rui
Barbosa, em Salvador, Bahia.
Um dos aspectos
polêmicos da vida de Rui Barbosa tem a ver com o período em que foi o primeiro ministro
da Fazenda, no início da República, de 15 de novembro de 1889 até 21 de janeiro
de 1891. Ele determinou que todos os documentos relacionados a registros de
posse de escravos fossem queimados. Em seu entender, era necessário apagar da
História a mancha da escravidão.
Os simpáticos à medida alegam que ela visava
impedir que os antigos proprietários de escravos reivindicassem indenizações do
Estado, depois de já terem explorados os escravos como propriedades durante
anos. Os críticos condenam a atitude, alegando que deveria ter sido elaborado
um documento legal que impedisse tal reivindicação, o que evitaria a destruição
de inúmeros documentos históricos, que serviriam de estudo daquele período. Outra
crítica à sua atuação no ministério foi à sua prática de atender diversos
pedidos de nomeações políticas.
A Fundação Casa de Rui
Barbosa esteve ameaçada durante o governo de triste recordação de Fernando
Collor de Mello (1990-92). Com um falso discurso modernizador, Collor colocou a
Fundação em uma lista de instituições que seriam extintas, o que causou uma
forte mobilização de funcionários e cidadãos contra a medida, que acabou sendo
revista.
Utilizei os dados históricos disponibilizados
pela página da própria Fundação Casa de Rui Barbosa na internet, além da página
riodejaneiroaqui, sobre a polêmica da destruição dos documentos históricos. E ainda
as matérias da Folha de São Paulo, de 24/02/2013, assinada por Flora Süssekind:
“Futuro da Fundação Casa de Rui Barbosa é posto em xeque”, e da revista Veja,
de 06/9/2000, de João Gabriel de Lima: “O balcão da águia baiana”. fr








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