"A moreninha", Joaquim Manuel de Macedo, São Paulo, editora Klick, 1997, 162 páginas (Coleção Livros O Globo, vol. 11).
Eu li o livro, mas não gostei. A estória é, atualmente, muito ingênua e exageradamente romântica. Mas, quando foi lançado, em 1844, fez enorme sucesso. O livro, publicado no mesmo ano em que o autor formou-se em Medicina, é considerado o primeiro romance propriamente brasileiro, descrevendo os costumes do país na época. Inicialmente, foi lançado na forma de folhetim de jornal, sendo publicado aos poucos, para atrair assinantes.
Joaquim Manuel de Macedo (1820 -1882) preferiu seguir as carreiras de professor, jornalista e escritor. Foi professor de Geografia e História no Colégio Pedro II, e dos filhos da princesa Isabel. Exerceu também os cargos de deputado provincial e geral. “A moreninha” é o primeiro de muitos livros que escreveu, e também o de maior destaque, inclusive tendo sido adaptado para o cinema e novelas de televisão. É o patrono da cadeira nº 20 da ABL (Academia Brasileira de Letras). Morreu aos 61 anos, quando já sofria de problemas mentais.
A estória é contada por um narrador, e tem início em uma aposta feita entre quatro amigos, estudantes de Medicina, como o autor. Filipe convidou Augusto a ir com ele, Fabrício e Leopoldo à casa de sua avó, para passar o ‘dia de Sant’Ana’, dia 26 de julho, em homenagem à Maria, mãe de Jesus. A casa ficava em uma ilha no estado do Rio de Janeiro, mas o autor sempre se refere a ela como “ilha de...”, sem dizer o seu nome. Assim como era vago também nas datas e outros lugares.
A aposta era que Augusto, um namorador que se orgulhava em dizer não ficar com nenhuma moça mais de 15 dias, deixaria a ilha apaixonado por uma das jovens moradoras do local. Filipe iria apresentar a Augusto duas primas, algumas amigas delas, e sua irmã, D. Carolina, de apenas 14 anos, mais conhecida como “moreninha”. Esta era muito levada, brincalhona e até impertinente. O combinado foi redigido nos seguintes termos:
“No dia 20 de julho de 18... na sala parlamentar da casa nº ... da rua de ... sendo testemunhas os seguintes estudantes Fabrício e Leopoldo, acordaram Filipe e Augusto, também estudantes, que, se até o dia 20 de agosto do corrente ano, o segundo acordante tiver amado a uma só mulher durante quinze dias ou mais, será obrigado a escrever um romance em que tal acontecimento confesse; e, no caso contrário, igual pena sofrerá o primeiro acordante.”
Quando tinha 13 anos, Augusto tinha conhecido uma menina de sete anos em uma praia da Corte, no Rio de Janeiro. As duas crianças brincaram, e a menina disse que, quando os dois “crescessem”, iriam se casar, passando a se tratar como “meu marido” e “minha mulher”. Ao ver um menino chorar, ficaram sabendo que o seu pai estava doente, e foram até a sua casa. Era “um ancião de cinquenta anos, pouco mais ou menos”. Ao perguntar à sua esposa, qual a enfermidade, surpreenderam-se:
“- Oh, meus meninos, respondeu a aflita velha, ele sofre uma enfermidade cruel, mas que poderia não ser mortal... porém é pobre... e morre mais depressa pelo pesar de deixar seus filhos expostos à fome!... morre de miséria!... morre de fome!
- Fome! Exclamamos com espanto: fome! Pois também morre-se de fome?...”
Sensibilizadas, as duas crianças deram ao senhor o que tinham para ajudá-lo. A menina, uma moeda de ouro, recebida do seu padrinho; o garoto, uma nota, “não me lembro de que valor”, recebida de sua mãe. A família agradeceu, emocionada, e o senhor predisse que os dois se casariam no futuro. E pediu a eles que oferecessem algo que tivessem consigo um ao outro. O menino tinha um alfinete de camafeu, dado a ele pelo pai, que o senhor quebrou o pé. A menina entregou um botão de esmeralda.
O senhor pediu que a esposa cosesse os dois objetos dentro de pedaços de tecido. O de cor branca, com o alfinete de camafeu, pediu que o menino desse à garota; e o de cor verde, com a esmeralda, pediu à menina que oferecesse ao amiguinho. E disse a cada um que tivessem “bastante força para ser constante e amar para sempre” o outro, e que guardassem bem o seu presente. As duas crianças despediram-se depois, prometendo mutuamente guardarem para sempre os presentes. O “ancião”, já muito doente, acabou morrendo no dia seguinte.
As duas crianças não se viram mais. Anos mais tarde, Augusto teve algumas desilusões amorosas, tendo sido enganado por namoradas. Ele, então prometeu ter um único amor, a sua “mulher”, aquela menina que conheceu quando tinha 13 anos, e os seus relacionamentos futuros seriam apenas “divertimentos dos meus olhos e o passatempo de minha vida”.
Aviso: O texto a seguir contém revelações sobre o final do livro.
Mas, com a convivência com aquela “moreninha”, Augusto acabou por se apaixonar, declarando-se a ela, que, conhecendo a existência de sua prometida, disse para ele manter a promessa. A moça, no entanto, tinha guardado com ela aquele pedaço de pano com um alfinete de camafeu, assim como Augusto sempre guardara o seu, com a esmeralda.
Os dois se deram conta que eles eram aquelas crianças há sete anos, na praia, e ela aceitou o pedido de casamento. Naquela época, final do século 19, eram comuns casamentos de menores de idade. Era também um tempo que uma estória excessivamente romântica como essa agradava bastante o público leitor. E Augusto teve que escrever um romance, a que deu o título ‘A moreninha’. Alguns estudiosos acreditam que a personagem título seria a namorada e futura esposa do autor. fr
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